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25/09/08

Uma vida inteira à esperma

Aquele clítoris não parava de palpitar.
Aquele pénis quente, com quem ia ao cinema de vez em quando, penetrou-a.
Cheira a gente.
Sabe a sexo.

Um espermatozóide ao lado e eu podia ser um Carlos Veríssimo. Uma cantora. Um astronauta. Uma arqueóloga. Um advogado. Ter 1.70 m de altura, ser moreno, de cabelos compridos. Ser um pedófilo. Uma actriz. Um anão. Um preto. Um tibetano. O presidente dos EUA. Um cigano. Uma Ucraniana. Um mercador nos Emirados Árabes Unidos. Ser de esquerda. Ter pais pobres. Estar num Colégio de Freiras.
Ser surda.
Ou não ser.
Um espermatozóide ao lado e eu podia: Não ser.

Mas depois há dias em que acordo com uma lucidez extrema, assoberbada, arrogante.
Uma lucidez acerca do que sou, do que quero. Acerca das minhas tarefas profissionais e das minhas relações pessoais.
Quero uma relação pessoal. Mas evito-a com medo de realizar todas as tarefas que me foram penetradas à nascença, e assim, a minha vida já foi. Já está vivida, e depois não tenho tomates para mais.
E depois, mesmo com clítoris a palpitar, não quero pénis no cinema.
Não cheira a gente, nem sabe a sexo.
Não sei se estou a ser clara.
E vivo esta angústia muitos dias, e muitas noites: o querer já realizar mil sonhos e desejos que tenho e sinto, mas saber que ao fazê-lo: JÁ FOI. JÁ ESTÁ. JÁ PASSOU. JÁ ACABOU.
JÁ ESTOU MAIS PERTO DO FIM.
E FOI ISTO: A MINHA VIDA.
Não sei se fui Carla.

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