Carla Veríssimo cria site para se dar a conhecer e ao seu trabalho.

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29/09/08

CS

Como é que se escreve uma pessoa genial?
Como, a ponto de sentir a necessidade de comunicação? A necessidade de agarrar num lápis, num papel e vir aqui escrever estas coisas difíceis?
Estas coisas complicadas de explicar quando se escreve…? Porque de facto não se escreve. Vive-se.
Como se escreve uma forma peculiar de falar, uma expressão, Pensa, Pensa!, um sorriso, um olhar?
Como se explica a simpatia, a amizade, o esforço, a humildade, o carinho, a garra, a simplicidade, a dedicação?
Como é que se escreves TU?

25/09/08

Uma vida inteira à esperma

Aquele clítoris não parava de palpitar.
Aquele pénis quente, com quem ia ao cinema de vez em quando, penetrou-a.
Cheira a gente.
Sabe a sexo.

Um espermatozóide ao lado e eu podia ser um Carlos Veríssimo. Uma cantora. Um astronauta. Uma arqueóloga. Um advogado. Ter 1.70 m de altura, ser moreno, de cabelos compridos. Ser um pedófilo. Uma actriz. Um anão. Um preto. Um tibetano. O presidente dos EUA. Um cigano. Uma Ucraniana. Um mercador nos Emirados Árabes Unidos. Ser de esquerda. Ter pais pobres. Estar num Colégio de Freiras.
Ser surda.
Ou não ser.
Um espermatozóide ao lado e eu podia: Não ser.

Mas depois há dias em que acordo com uma lucidez extrema, assoberbada, arrogante.
Uma lucidez acerca do que sou, do que quero. Acerca das minhas tarefas profissionais e das minhas relações pessoais.
Quero uma relação pessoal. Mas evito-a com medo de realizar todas as tarefas que me foram penetradas à nascença, e assim, a minha vida já foi. Já está vivida, e depois não tenho tomates para mais.
E depois, mesmo com clítoris a palpitar, não quero pénis no cinema.
Não cheira a gente, nem sabe a sexo.
Não sei se estou a ser clara.
E vivo esta angústia muitos dias, e muitas noites: o querer já realizar mil sonhos e desejos que tenho e sinto, mas saber que ao fazê-lo: JÁ FOI. JÁ ESTÁ. JÁ PASSOU. JÁ ACABOU.
JÁ ESTOU MAIS PERTO DO FIM.
E FOI ISTO: A MINHA VIDA.
Não sei se fui Carla.

23/09/08

Viagens na minha terra dos outros

As nossas fotos de viagem podiam ter sido eu na Acrópole, eu no Red Light District, eu no Wawel e eu em todos esses lugares-comuns.
Mas foram restaurantes cheios de malas, cobertores, aparelhagens, tapetes farfalhudos, guitarras partidas, candeeiros, telefonias, bonecos de peluche, bonecos de plástico, bancos, gaiolas, panos, raquetes, espanta-espíritos, detergentes, camelos de plástico, k7s, almofadas, naperons e tralhas várias.
As nossas fotos de viagem podiam ter sido tu no barco, tu no avião, tu nos jardins, tu nas bicicletas.
Mas foram homens de mãos sujas, negras, IMUNDAS, encardidas pelo tempo. Foram gatos em cima das mesas, enquanto pessoas a jantar. Foram teias de aranha, ratazanas de estimação, baratas, pulgas, caraças e daí pra baixo! Foram iraquianos escada acima escada abaixo à procura de lugar para nós.
Foram canelonni com sabor a canela. Foram dentes de crianças a puxar bifes de vacas. Foi um desconhecido de 40 anos e 2 metros a levar-me para casa. Fui eu a apalpar as mamas de uma gaja, que pensei ser um gajo mascarado de gaja. Foram os nossos vizinhos na casa sem paredes, acasalados um no outro. Foram velhas de ossos desconjuntados. E fui eu a escrever isto às 3 da manhã. A escrever e a flatular-me toda como se não houvesse amanhã.
As nossas fotos de viagem sou eu a inventar um novo emprego: andar pelo mundo de caderninho na mão, a escrever sobre terras assim.
Exmos. Senhores,
Na sequência do vosso anúncio, venho por este meio enviar a minha candidatura a funções de Escritora. Escritora dos Povos. Do mundo. Dos lugares. Dos cheiros. Das músicas. Dos espaços. Das comidas. Das línguas. Possuo como experiencia profissional 6 meses na Grécia, 3 semanas na Polónia, 5 dias na Holanda, e aterragens em Londres, Bruxelas e Madrid.
Mais do que motivada, sinto-me inteiramente apta a desempenhar as tarefas que a função exige, de um modo atento e imparcial.
Sem mais, agradeço a atenção e aguardo uma resposta da vossa parte.
Com os melhores cumprimentos,
Carla Veríssimo

16/09/08

Preciso de te escrever.
Escrever de ti. De mim. De ti em mim. Do nós que fomos. Do porquê. Do como. Do onde.
Preciso do quando.
Do quê.
Do para.
Do por.
Escrever-te as linhas do teu corpo no meu.
Escrever os teus beijos. O teu carinho. As tuas carícias.
Faz uns dias que tu em mim. Não sei precisar a hora. Nem da conversa, nem de nós de pé.
Não sei precisar o segundo em que te disse Senta-te aqui. Não sei precisar o instante em que te deitaste para trás e entraste assim na minha casa. Não sei do tic-tac do relógio, quando o tic-tac do músculo do teu braço direito, debaixo da minha cabeça.
Não sei de quando as tuas massagens nas minhas costas, e as tuas mãos atrevidas nas laterais dos meus seios; não sei quando terminaste, nem te baixaste e nos beijámos, de lado, eu de barriga para baixo, tu de barriga para baixo. Tu, em cima de mim.
Não sei precisar a hora disto tudo, mas sei precisar de ti.
Precisar que entres assim na minha vida, como entraste assim na minha casa, e como entraste, assim, em mim……….
Sei precisar de te escrever.
Não páro de pensar em ti, de escrever em ti.
Retenho aquele beijo de despedida, no canto da boca, em que os teus lábios procuraram os meus, num prazer fugidio; retenho os teus sorrisos, os gestos, as expressões faciais, o piscar de olhos, os beijos que me davas, e os que não davas, mas simulavas, naquele gesto sem ninguém mais ver.
Custaram-me a existência dela, a fotografia dela. Custou-me o som de ave nocturna, a cada mensagem; custou-me o porta-chaves do carro com o nome dela; custou-me o anel no teu dedo; custou-me tu e ela, os projectos, as perspectivas, a casa, as férias, …
Retenho as tuas mãos nas minhas coxas, nas minhas costas, os teus lábios e a tua língua no mais íntimo de mim… Esse beijo muito leve, quase só um sopro, na minha virilha...
Retenho os teus cabelos, o teu corpo. Tu nú, embrulhado na toalha, depois do banho. Os teus lábios desenhados, o teu rabo,…
Se pudesse largar tudo. Se pudesses largar tudo.
Sem medos, sem hesitares.
Sem dúvidas.
Retenho o nosso baloiçar na rede.
Reaprendi que a vida são passos dados num caminho de pó, e um dia há pegadas que se cruzam.
Foste um sorriso na minha cara, como não me desenhavam há muito, muito tempo.
Retenho a tua voz. O teu sotaque.
O teu olhar doce, meu doce.
Retenho a loucura das noites, dos impulsos, das cumplicidades, da intimidade.
Pergunto-me Porquê?
Como? Onde? Quando? Quê? Para? Por?
Vou fechar-te um pouco.
Preciso de escrever as linhas do teu corpo no meu.